NADA MUDOU
Joaquim Carvalho Cruz (sim, só uma coincidência) tinha 21 anos quando, vestindo azul, carregou sua magreza e seu semblante de esforço ao até hoje único ouro olímpico do Brasil em provas de pista no atletismo. Correu a final dos 800 metros rasos dos Jogos de Los Angeles, em 1984, em 1 minuto e 43 segundos, recorde olímpico na ocasião. Lá se vão quase 30 anos. E tanta coisa mudou de lá para cá. A União Soviética, que boicotou aquela Olimpíada, desapareceu. A China ficou só em quarto. O próprio Joaquim, que continua magro, modesto e tímido, já não tem aquela cabeleira toda, ganhou uns fios grisalhos e agora fala com leve sotaque americano - reflexo dos 30 anos nos Estados Unidos, onde estudou, casou, cria seus dois filhos adolescentes, trabalha num centro médico da Marinha americana procurando talentos esportivos entre militares feridos de guerra, treina atletas olímpicos e paraolímpicos do país e, finalmente, onde pensa em maneiras de mudar o Brasil por meio do esporte.
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“É incrível que nesses 30 anos quase nada tenha mudado estruturalmente nessa área. Será que nossos dirigentes e políticos ainda não enxergaram que a solução para nossos problemas está no esporte na escola?”, ele pergunta retoricamente, porque sabe bem a resposta. “É na escola que formaremos uma base grande da qual será possível tirar muitos campeões.” De outro modo, ele lamenta, continuaremos a suspirar por esporádicos heróis como o ginasta Arthur Zanetti, ouro nas argolas em Londres, e os irmãos Falcão do boxe, que treinavam humildemente socando humildes bananeiras num humilde quintal. “A falta de oportunidades para o garoto brasileiro que queira ser esportista me assusta.”
Mas Joaquim não fala apenas. Ele também age. Em Brasília, onde mantém um instituto que leva seu nome, acaba de iniciar um processo seletivo para descobrir e formar fundistas capazes de medalhar na Olimpíada de 2020. O Programa Rumo ao Pódio, patrocinado pela multinacional do ramo de embalagens Tetra Pak com R$ 1,4 milhão, recebeu 1.400 inscritos. Depois de uma fina peneira inspirada no modelo de seleção dos Seals americanos, sobrarão 30 jovens de 16 a 20 anos.
Na quinta-feira, Joaquim estava no Estádio Olímpico de Londres quando falou ao Aliás por telefone. Entre uma resposta e outra, dirigia palavras de conforto à corredora americana Alice Schmidt, sua pupila, desclassificada na semifinal dos 800 metros. Ele contou como foi, desta vez nos bastidores, fazer história de novo nos Jogos. Joaquim também era o técnico da atleta saudita Sarah Attar, de 19 anos, que de calça, mangas compridas e lenço na cabeça, foi ovacionada pela plateia mesmo terminado sua prova em último lugar. Pela primeira vez o comitê olímpico saudita permitiu a participação de mulheres nos Jogos. E se até isso mudou...
Christian Carvalho Cruz, de O Estado de S.Paulo
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